terça-feira, 7 de julho de 2009

A pressa prossegue. Curso de Nanotecnologia é aprovado no CEG

Na última sessão do Conselho de Ensino de Graduação (CEG), foi aprovado o curso de Nanotecnologia. A bancada discente apresentou o parecer abaixo, do qual fui relator, argumentando as razões pedagógicas, estruturais, epistemológicas e regimentais pelas quais o curso deveria ser reformulado. A aprovação se deu nos termos do divisionismo e da mentira, o argumento era que "a esta altura do campeonato, após 3 anos nada poderia ser revisto", que refuto, pois todas as conquistas concretas só foram possíveis com a união dos estudantes, professores e funcionários contra os ataques à Educação pelo Governo (seja ARENA, PMDB, PRN, PSDB ou PT) e a mentira de que foram 3 anos, o curso começou a ser elaborado após a imposição do REUNI goela abaixo que fará 2 anos em Outubro. A maioria dos conselheiros não sabia nem de longe o que é a Nanotecnologia. A Polícia Política quer transformar a Universidade em Palanque Eleitoral (no qual a Universidade se tornou um Campeonato) já que o Lula agora é candidato a Santo, pois se espalha pelos corredores da UFRJ que houve um Milagre, que o REUNI mudou da Água pro Vinho; ser cético é mais científico.


Daniel Bicalho Hoefle (Jesus)

PARECER


Este parecer visa apontar as incongruências e debilidades acerca da proposta do curso de Nanotecnologia. Primeiramente, é frisado que este parecer objetiva não fechar a porta para esta promissora área da ciência aos estudantes da graduação, mas sim ponderar o papel da nossa Universidade. Louvam-se os esforços concretizados até agora nos Laboratórios de Pesquisa, nas Pós-Graduações e nas atividades de Extensão no referido tema de Nanotecnologia e Nanociência. E ao que se cabe, é necessário definir a melhor abordagem para tratá-la na graduação. Devido às complicações e à falta familiaridade dos companheiros do CEG, se visa elucidar e contra argumentar algumas práticas que levam determinados sofismas a serem exaustivamente repetidos como verdades incontestáveis.

Mas como? Se estão todos cheios de boas intenções? Se este processo chegou a este Conselho por satisfazer os trâmites burocráticos, ou não? A leitura do processo revela que o percurso foi muitas vezes afobado, no qual se aprovou nas Congregações das Unidades às pressas a partir dos argumentos de pressão política de que quem não está dentro está fora. E, mais comprometedor, alegaram que o curso já estava em fase de implementação antes de passar pelo CEG, que é uma clara manobra para esvaziar este fórum democrático como se tudo estivesse acertado de antemão sem que haja discussão aberta. A realidade é que os novos cursos são amplamente divulgados na última edição do Jornal da UFRJ como certos para o próximo Processo de Seleção.
As aprovações nas Congregações foram condicionadas a um aumento do efetivo docente, bem considerável, 53 em quatro anos e 12 só no primeiro ano, ao qual se entende como imprescindíveis e para garantir a qualidade deverão ser Concursados Plenos com Dedicação Exclusiva, e, também, foram condicionadas ao aumento da Estrutura Física, que está pouco contemplada no projeto que trata por alto de meia-dúzia de Laboratórios de Física Experimentais em Xerém muito aquém da real necessidade do curso. A questão dos Laboratórios de Graduação, que já se encontram sucateados e lotados, deve ser vista como primordial para a Expansão da Universidade onde a falta de planejamento leva à precarização, como no caso da Biologia que dobrou o seu ingresso este ano, e, como conseqüência, apenas metade dos calouros cabe nos laboratórios por vez levando a um revesamento da presença. Entretanto, algumas restrições estabelecidas pela aprovação na Escola Politécnica entram em contradição com o projeto como não ter aulas em Xerém e não ter curso de reforço em Cálculo e Física.

Ao analisar minuciosamente as três Propostas Pedagógicas, a original em pouco difere das duas redações seguintes. Das quatro ênfases da 1ª redação (Física, Biofísica, Química e Materiais) as duas últimas foram suprimidas na 2ª redação para se aprovar de qualquer jeito para o Vestibular do ano passado, e na 3ª redação retornou-se com a ênfase de Materiais e mudou-se o nome da ênfase de Biofísica para Bionanotecnologia. Mas em nada mudou a estrutura do texto, como se as congregações fossem instâncias meramente simbólicas, deixando a impressão de que o projeto é intocável. Fato apoiado pela ausência de documentação de como foi constituída a Comissão de Trabalho que elaborou o projeto, da qual se deve ponderar se é legítima. Em um email em anexado logo após o parecer, o prof. Rodrigo Barbosa Capaz esclareceu que a Comissão surgiu espontaneamente e pediu aval aos Diretores das Unidades. Que é estranho, pois além de não estar documentado no processo, é um desagravo ao Regimento Geral da UFRJ que determina que a proposição de novos cursos é uma atribuição dos Conselhos de Centro e, portanto, só após as deliberações dessas instâncias seriam válidas a construção de um Projeto Pedagógico e a indicação dos professores para escrevê-lo. Ao que consta no processo, a proposta chegou totalmente formulada ao Conselho de Centro do CCMN, e não há qualquer apreciação dos Conselhos do CT e do CCS que são representativos de Unidades envolvidas.

Outra questão obtusa é a “simbiose” com o INMETRO, que embora amplamente citada ao longo do processo, não há sequer um memorando assumindo qualquer responsabilidade por parte daquela instituição. Esta questão gerou uma crise entre o Instituto de Química e o Instituto de Física, que precisa ser conciliada antes da aprovação deste curso caso contrário estará comprometido. O IQ argumenta que há motivações políticas para formação de mão-de-obra para o INMETRO e que os protocolos formais de criação de novos cursos não foram seguidos e que a própria Interdisciplinarida de também é contestável pela carência de Bioquímica I no currículo básico substituída pela disciplina menos pertinente Bioquímica de Macromoléculas. E ainda por considerar que a ênfase de Química teria as mesmas incumbências profissionais do Químico com Atribuição Tecnológica por sobreposição do conteúdo dos currículos com exceção de três disciplinas que podem ser cursadas como eletivas, assim causaria problemas com o Conselho Regional de Química (CRQ), que levou, então, à congregação do IQ a votar pela retirada desta ênfase. Esta posição deve ser respeitada por ter sido a única Unidade que democraticamente discutiu o curso de Nanotecnologia em todos os seus Departamentos.

Logo em seguida, vem a resposta da Comissão de Trabalho – que estranhamente adquiriu caráter de instância e pôde sair anexando documentos ao processo – que se contradiz ao longo de uma carta, que primeiro faz o discurso de que as unidades tinham que sair de seus “compartimentos” e enxergar o lado de fora e, depois, que não enxergaria os Conselhos e demais Entidades de Classe. Claro que os Conselhos e demais Entidades de Classe são instâncias burocratizadas que merecem repúdio por violar a Autonomia Universitária ao estabelecerem que os profissionais, além do diploma, precisam de suas carteiras e pagar lhes tributo. Só que fazer esta crítica apenas para facilitar a aprovação deste curso é puro oportunismo, para fazerem jus à palavra, seria interessante que abrissem um processo contra o Ministério do Trabalho para reverter esta determinação. E admitiram que a sobreposição de currículo das ênfases da Nanotecnologia com os referidos cursos tradicionais foi intencional, contra o qual se cita o grande imbróglio da Química Industrial e da Química com Atribuição Tecnológica que por possuírem a mesma incumbência profissional serão fundidas por determinação do CONSUNI a pedido do CRQ.

Muito além dos egressos não terem uma carteira profissional, não terão uma formação profissional de fato. Tendo apenas 150 créditos de matérias teóricas e práticas (cerca de 25% a menos do que os créditos dos cursos tradicionais) sem disciplinas avançadas, como consta no Projeto Pedagógico. O curso de Nanotecnologia pretensiosamente tem como objetivo acabar com a necessidade de Pós-Graduação (7 anos em 4), mas transpõe a divisão entre latu sensu e strictu sensu para a Graduação. De maneira que seu conteúdo não passa de generalismo com pitadas de nanocuriosidade seguido de treinamento para realizar procedimentos laboratoriais sem pensamento crítico, os chamados Estágios Rotativos.

O Projeto Pedagógico falha gravemente com a Interdisciplinarida de, não há convergência entre a Química, Física e Biologia nas disciplinas – chega ao cúmulo de nem envolver o Instituto de Biologia. As matérias de diferentes Unidades só são oferecidas simultaneamente, mas não há interlocução entre as mesmas levando o curso a se autofragmentar em ênfases. Aliás, do ponto de vista epistemológico, o próprio conceito de Interdisciplinarida de é entendido erroneamente, pois a grande divisão acadêmica é entre Exatas e Humanas e se não suplanta esta divisão. Sendo assim, como todos os cursos de graduação possuem diversas disciplinas de outras Unidades em seu currículo podem ser classificados como Interdisciplinares pelo conceito errôneo de praxe, não havendo a referida carência por cursos desta natureza. A argumentação não se sustenta.

Afinal de contas, o que é a Nanotecnologia? A Nanotecnologia é o emprego da Nanociência para construir soluções fantásticas para problemas reais, sendo muito mais abrangente do que o viés adotado de novos materiais. Esta contradição fica evidente na mudança do nome da ênfase de Biofísica para Bionanotecnologia, que na verdade é muito mais ampla do que próteses e dentaduras, diversas aplicações muito mais inusitadas nesta área já são realidade como as nanovacinas e nano-sondas de DNA. Como toda tecnologia não é em si boa ou ruim, a Nanotecnologia pode ser utilizada tanto para salvar vidas quanto para fazer armas de destruição em massa (que já fazem parte do arsenal da China e EUA). E com toda clareza pode ser dito que a Nanotecnologia não é o Fim da História e que tudo depende de como usá-la para a Emancipação Humana.

Outra debilidade, que merece ser apontada, é em relação à Química, por falta da disciplina de Química Quântica e a já falada Bioquímica I, entre outras, pois a Nanotecnologia não é exclusividade da Física, sendo a própria subversão da Mecânica Clássica e mesmo a Teoria da Relatividade é mais útil para descrever a órbita do planeta Mercúrio. Em relação à ênfase em Materiais, é fraca pela falta da matéria-chave Resistência dos Materiais. O próprio Projeto Pedagógico admite que o egresso será apenas um mero ajudante de um profissional realmente qualificado nas áreas tradicionais, aonde se desmascara o falso caráter inovador do curso que não criará um profissional completo para tratar das questões de ponta. Por um lado estão as atribuições de engenheiro como a solução de problemas, por outro lado estão as atribuições de cientista como a teorização, e dado à falta de especificidades de Nanotecnologia e Nanociência no currículo, será incapaz de realizar qualquer uma das atribuições com a firmeza necessária.

Quanto ao mercado de trabalho para o egresso, estará restrito ao setor público, pois o setor privado não realiza pesquisa de ponta no Brasil. Por tanto, é até válido que se vá trabalhar no INMETRO, porém devem se consultar outros setores e empresas estatais sobre a possibilidade da abertura de concursos. Deve-se considerar ainda que para o pleno desenvolvimento do setor, é necessária a construção de uma grande empresa estatal, uma Nanobrás.

Ademais, fica a crítica de que é incompatível vincular o Projeto Pedagógico do curso ao Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) cujo mérito não vem ao caso, mas no qual não foi aprovada a participação da UFRJ pelo CONSUNI, bem como, a Nanotecnologia não está constituída enquanto setor econômico, portanto não sendo passível a aceleração do seu crescimento.

Diante das questões relatadas, este parecer indica a necessidade de uma reformulação do Projeto Pedagógico com contribuição democrática de todos os Departamentos de todas as Unidades envolvidas para a construção de novas disciplinas repensando todos os currículos da área de Exatas a partir da Integração com a Nanociência, bem como, a indicação de uma Comissão de Trabalho legítima pelos Conselhos de Centro junto com a criação de um Núcleo de Estudos pelo CEG em concomitância com a já existente Câmara de Nanotecnologia da PR2.


Assinam: Daniel (Titular), Mariano (Titular), Marcos (Titular) e Leomir (Suplente)

Nenhum comentário: